quinta-feira, 5 de julho de 2012

Juiz, filho de prefeita e agiotas aparecem em 'grampos' da PF


CORREGEDORIA DO TJ-MA INVESTIGA
Magistrado Sidarta Gautama quebra silêncio sobre investigação e fala com exclusividade ao Jornal Pequeno
POR OSWALDO VIVIANI
O juiz estadual Sidarta Gautama Farias Maranhão (de Caxias), o empresário Eduardo José Barros Costa (filho da prefeita Arlene Costa, do município de Dom Pedro, e dono da construtora Imperador) e dois suspeitos de praticar agiotagem – Gláucio Alencar Pontes Carvalho e João Batista Magalhães – aparecem em escutas da Polícia Federal feitas em janeiro de 2010. Os 'grampos' da PF dariam subsídios para a operação 'Capitanias Hereditárias' (ou 'Donatários'), desencadeada no fim de fevereiro de 2011, que revelou desvios de R$ 150 milhões em recursos federais no Instituto Nacional de Reforma Agrário (Incra) do Maranhão e derrubou a cúpula do órgão no estado.
Em ao menos três dos diálogos 'grampeados' com autorização judicial – a cujo teor o Jornal Pequeno teve acesso –, o juiz Sidarta Gautama conversa com Eduardo Costa, conhecido em Dom Pedro como 'Eduardo DP' ou 'Imperador', e os dois tratam de um valor que Eduardo estaria devendo ao magistrado.
Nas conversas com o juiz Sidarta Gautama, Eduardo diz que naquele período (fim de janeiro de 2010) não poderia pagar o valor total devido, mas promete acertar 'os juros'. Sidarta concorda e diz que o gerente do Banco do Brasil de Caxias (identificado como Sampaio) vai entrar em contato com Eduardo para informar o número de sua conta bancária, o que efetivamente ocorre, sendo que Eduardo pede que o gerente envie os dados por meio de uma mensagem de telefone celular.
Em meio aos diálogos, surgem os nomes dos suspeitos de agiotagem Gláucio Alencar Pontes Carvalho – preso no dia 13 de junho, em São Luís, acusado de ser um dos mandantes do assassinato do jornalista Décio Sá, ocorrido em abril passado – e João Batista Magalhães, investigado pela PF em duas operações – 'Astiages' (3 de fevereiro de 2011, em Barra do Corda) e 'Capitanias Hereditárias/Donatários' (25 de fevereiro de 2011, no Incra-MA).
Os diálogos deixam claro que tanto Eduardo Costa como Sidarta Gautama conhecem bem Gláucio Carvalho e João Magalhães. Os supostos agiotas participariam do negócio 'cobrindo' o valor devido por Eduardo ao juiz, para posterior reposição com verbas do orçamento da Prefeitura de Dom Pedro.
'Magáiver' – João Magalhães à vezes é tratado, nas conversas 'grampeadas', pelo apelido de 'Maga'. Também é chamado de 'Magáiver' – numa provável alusão a Angus MacGyver, personagem de uma famosa série de TV ('Profissão Perigo'), exibida no Brasil nos anos 1980 e 1990. MacGyver era mestre em escapar de situações difíceis utilizando-se de recursos inusitados.
O apelido não deixa de ser apropriado a João Batista Magalhães. Suas peripécias foram assunto até de uma reportagem na revista IstoÉ, em abril de 2011. Segundo a matéria, Magalhães 'Magáiver' – que já foi assessor de Washington Luiz Oliveira, vice-governador do Maranhão e atualmente candidato do grupo Sarney à eleição para prefeito deste ano – se escondeu na sede do Partido dos Trabalhadores, em Brasília, para não ser preso durante a operação 'Astiages'. Ficou lá até conseguir um habeas corpus para seguir livre.
Inquérito desmembrado – Como os fatos que surgiram dos 'grampos', envolvendo o juiz estadual Sidarta Gautama, eram alheios à investigação central da operação 'Capitanias Hereditárias/Donatários' (desvio de recursos federais no Incra-MA), o delegado encarregado por coordenar a operação, Pedro Roberto Meireles Lopes, desmembrou do inquérito a parte referente ao magistrado e solicitou à Justiça Federal (que decretou sigilo de Justiça) e ao Ministério Público Federal o envio do processo gerado (nº 28724-21.2011.4.01.3700) ao órgão competente – no caso, o Tribunal de Justiça (TJ-MA).
Em março deste ano, o presidente do TJ-MA, desembargador Antonio Guerreiro Júnior, recebeu o processo e o encaminhou à Corregedoria Geral de Justiça (CGJ) do estado.
O caso está na fase dos depoimentos, sendo que já foram ouvidos o juiz Sidarta Gautama, o suspeito de agiotagem Gláucio Alencar e o empresário Eduardo Costa. João Magalhães deve ser o próximo a ser chamado a depor na CGJ.
Relação com Gláucio foi 'exclusivamente comercial', afirma juiz
Apesar de a suspeita de envolvimento do juiz Sidarta Gautama com agiotagem já ter sido mencionada em vários blogs de jornalistas maranhenses, o magistrado nunca contestou as postagens, mas o fez após uma nota publicada na quarta-feira (27) na coluna do jornalista Jotônio Vianna no JP ('Caxias em Off'). Veja a íntegra da resposta do magistrado:
'Caro Jotônio,
Malgrado louve os superlativos predicados do jornalista, cuja coluna é um dos grandes catalisadores do noticiário político caxiense e, por isso mesmo, creio que persiga a verdade como a maior expressão do verdadeiro conceito do jornalismo, resolvi quebrar meu silêncio em homenagem, sobretudo, à sociedade caxiense, a quem acho que devo todas as satisfações, porque dela estou a serviço.
Valho-me, portanto, desse espaço para rebater, de forma veemente, o que foi veiculado em sua coluna do dia 27 de junho, sob o título 'Repercussão', e em blogs da capital do estado. Meu caro, nenhuma correlação possuo com o 'caso Décio Sá'. Tanto que não há nenhuma menção do meu nome no inquérito que apura o delito, salientando ainda que tampouco há conteúdo dessa natureza nos blogs.
As falsas – convém frisar – catilinárias que lançam sobre minha pessoa seriam resultantes de um episódio exclusivamente comercial que mantive com o sr. Gláucio, a quem atribuem a autoria do crime. Esse episódio estava sendo analisado em sindicância instaurada na Corregedoria Geral de Justiça, e que, inclusive, preexiste ao desvendamento do crime, daí a razão do sr. Gláucio ter sido ouvido no procedimento administrativo.
Sucede que um jornalista soube que o sr. Gláucio deporia nessa sindicância e, distorcendo os fatos, sem qualquer investigação da verdade e de forma açodada, apressou-se em divulgar o envolvimento do meu nome ao sr. Gláucio, sem ao menos saber a razão do seu depoimento junto à Corregedoria.
Assim, venho a público esclarecer que não possuo qualquer relação com o 'caso Décio Sá' ou com qualquer outro tipo de fato que deponha contra as minhas obrigações de magistrado.
As afirmações divulgadas em blogs renderam ensejo a uma sucessão de aleivosias a meu respeito a que repilo vigorosamente. Infelizmente, os comentários desairosos publicados se escondem por detrás do biombo do anonimato, em razão da falta de regulamentação do uso do espaço da 'blogosfera' neste país, em que vige o estado democrático de direito e consagra a ampla defesa e o contraditório.
Mas, como compete a um magistrado, devo aguardar serenamente o deslinde do procedimento administrativo para, a partir daí, adotar as providências que o caso reclama, mesmo porque não creio que o açodamento e a falta de temperança devam permear a conduta de um magistrado.
Que o meu silêncio não se confunda, no entanto, com a inércia ou o assentimento com as afirmações publicadas. Atribua-se a minha moderação ao respeito que tenho à minha função, que reclama o decoro e o bom-senso como atributos necessários.
Portanto, caríssimo, ao tempo em que reitero que sequer há menção de meu nome vinculado ao 'caso Décio Sá', valho-me do seu espaço tão somente porque me sinto no dever de ofício de dar uma resposta à sociedade a que sirvo.
Cordiais saudações,
Sidarta Gautama.'

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